XVIII Domingo do Tempo Comum - Igreja de São Carlos Borromeu / Verona-Itália
Memória do nascimento de padre Mazza aos Céus – 31 de julho 2021
Irmãos e irmãs, acabamos de ouvir o quanto Deus nos ama e o quanto na história Ele se empenhou e ainda hoje se empenha em nos educar à liberdade e à vida plena. É a sua vontade, próprio do amor verdadeiro. Porém sempre marcado pela dor de não ser compreendido e pela constante ameaça de que todo bem dado caia em vão, graças a nossa frágil inteligência marcada pela mentalidade viciada.
De fato, trata-se de um perigo constante. Hoje, o apóstolo Paulo, na sua carta aos efésios, nos suplica em nome de Cristo: “Não torneis a proceder como os pagãos, que vivem na futilidade dos seus pensamentos, e se deixam corromper por ser desejos enganadores”, e lembra: “Não foi assim que aprendestes a conhecer a Cristo, se é que d'Ele ouvistes pregar ... e sobre Ele fostes instruídos, ...conforme a verdade que está em Jesus.”
Na primeira leitura Moisés prova esta ameaça de tudo terminar em nada: o perigo de todo seu empenho e todo o poder de Deus já manifestado ter sido em vão. Digo, tudo! Não só da sua vida dedicada e consumada nesta missão de profeta e guia, mas também da vida de quantos morreram (primogênitos, cordeiros, soldados e cavaleiros...) para que esta liberdade fosse alcançada.

Se nos parece ser um grande milagre Deus ter aberto o mar para nele o seu povo caminhar, maior ainda, e mais trabalhoso ainda, foi a obra de Deus, durante os 40 anos no deserto, conseguir abrir o coração do seu povo para nele o Senhor Deus passar.
Se nos parece uma grande obra de Deus o ato de libertar os israelitas das garras da escravidão, maior é a obra de Deus na dedicação persistente em educar os israelitas à liberdade, a serem livres e responsáveis de suas próprias vidas, ou seja, a ser um povo: O povo de Deus! Serem libertados é uma coisa, serem livres é outra bem maior. A liberdade não se consegue com o preço de uma rebelião ou revolução; a liberdade é um valor e para tal é necessária a educação.
De fato, murmuravam os israelitas contra Moisés, no deserto, dizendo: “Quem dera que tivéssemos morrido (...) no Egito, quando nos sentávamos junto às panelas de carne e comíamos pão com fartura! Por que nos trouxestes a este deserto (...)?”
À luz da palavra de Deus, já deveríamos entender como é que cidadãos desejem a volta de um regime totalitário, que cristãos se encantem à imaturidade de uma moralidade obtusa e preguiçosa do legalismo, que pessoas prefiram permanecer na gaiola já sem porteira, comendo sua ração garantida na latinha de sardinha, do que correr o risco do voo, de ser responsável de sua própria vida.
Protestos, indisposições dos israelitas: uma clara prova do quanto ainda lhes faltava o horizonte. Limitados às necessidades primarias, se encontravam presos mentalmente às compensações enganosas da escravidão. O maravilhoso é que toda esta ingratidão e ignorância não é motivo suficiente para fazer desistir aquele que Ama e é fiel.
Aquele que ama não desiste da meta e nem ignora as urgências: reconhece que na longa caminhada educativa em vista dos bens perenes, é necessário também atender as necessidades de bens imediatos, é necessário a obra da assistência. Disse de fato o Senhor a Moisés: “... Eu ouvi as murmurações dos filhos de Israel. Dize-lhes, pois:
‘Ao anoitecer, comereis carne, e pela manhã vos fartareis de pão”, e completou: “Assim sabereis que eu sou o Senhor vosso Deus”.
O que parece ser uma ostentação de poder, na verdade é uma preocupação de quem ama e quer alertar a uma tomada de consciência do alimento mais valioso nesta caminhada, isto é: Aquele que me sustenta e não aquilo que me dá o sustento; Aquele que me ama e não aquilo que dele posso receber. Mas a estrada à maturidade de um povo livre é longa e árdua. A reação dos israelitas é pra decepcionar qualquer um: “Que é isto? ”.
O desdém é revoltante, mas o fato é que para quem é escravo, olhar cabisbaixo, elevar o olhar. Seus olhos estão habituados a olhar e esperar o que lhe chega em suas mãos, e não ao que lhe liberta. As dificuldades de Moisés já nos adiantam na compreensão do sofrer de Jesus. O diálogo da multidão com Jesus é de machucar: típico de estranhos interessados. O evangelho é perspicaz ao nos narrar com sutil ironia o fato da multidão perceber a ausência de Jesus somente quando algo parece lhes faltar: uma distração que denuncia a falta de vínculo e uma percepção tardia que denuncia algo agora lhes interessar. E quando o encontra, a abordagem é chata, típica de quem quer marcar presença: “Mestre, quando chegaste aqui?”.
A resposta que Jesus lhes dá é merecida e educadora: “Em verdade vos digo: vós procurais-Me, não porque vistes sinais, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. Se interessem, não tanto pela comida que se perde, mas pelo alimento que dura até à vida eterna”. O diálogo continua, mas desencontrados, fogem do foco com uma pergunta típica de quem quer se apresentar bem religiosamente. Coisa de aluno querendo conquistar simpatia e favor do professor. “Que devemos nós fazer para praticar as obras de Deus?”.
É admirável como Jesus não se deixa abater e continua fiel no amar, insiste num diálogo que os liberte, que os faça parar de olhar a própria palma da mão como mendigo à espera da esmola, que os faça elevar seu olhar e finalmente o veja, e finalmente o conheça: “A obra de Deus consiste em acreditar n'Aquele que Ele enviou”.
O que se segue, não consigo pensar diferente: os olhos resolvem se encontrar no olhar atento de Jesus que a tempo buscava, e perguntam: “Que milagres fazes Tu, para que nós vejamos e acreditemos em Ti? No deserto os nossos pais comeram o maná, conforme está escrito: 'Deu-lhes a comer um pão que veio do céu'”. Jesus respondeu-lhes: “Em verdade, em verdade vos digo: Não foi Moisés que vos deu o pão do Céu; meu Pai é que vos dá o verdadeiro pão do Céu”.
Disseram-Lhe eles: “Senhor, dá-nos sempre desse pão”. Jesus respondeu-lhes: “Eu sou o pão da vida:
quem vem a Mim nunca mais terá fome, quem acredita em Mim nunca mais terá sede”.
Não quero acrescentar mais nada... Diante de um namoro, nos cabe o silêncio.
Pe. Alberto Moreira,
Superior Geral